30/08/2008

MODA SUSTENTÁVEL



Luiza Netto é mestranda do curso de Design na área de Tecnologia e Sociedade na PUC-Rio. O foco de sua tese é desenvolver uma CERTIFICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL PARA A INDÚSTRIA DE MODA, onde as preocupações sociais sejam inseridas em seus parâmetros e sugestões adequados ao Brasil.


Nesta entrevista, ela fala um pouco sobre a sua visão da moda na era da sustentabilidade, e como este conceito pode ser aplicado a uma das indústrias que mais cresce no Brasil.





Em quê, exatamente, consiste a sua tese?


Desde o inicio da graduação, tive um grande interesse pela questão ecológica, por isso busquei trazê-la para a moda quando desenvolvi o meu TCC. E desenvolvo minha tese de mestrado em cima das deficiências que encontrei em meu trabalho de TCC (em Bacharel em Design com Habilitação para a Moda, pelo Senai-Cetiqt).


Ao longo do trabalho, descobri várias deficiências e vi que a cadeia produtiva de moda não é organizada de forma sistêmica, tendo uma logística de produção em que o quantitativo prevalece. Logo, o quesito qualidade se torna secundário - seja na produção, nos processos, nas matérias-primas e suas formas de extração, ou seja, no ciclo de vida de um produto. Não há um controle dos resíduos, uma otimização nos processos nem uma melhoria para a empresa, para a qualidade de vida dos funcionários ou para o meio ambiente.


Na indústria de moda, o bem-estar está baseado no crescimento quantitativo, o próprio desperdício é considerado um “luxo”, uma consagração social. Para alcançar a sustentabilidade nessa indústria é necessária uma análise qualitativa que sugere uma abordagem quantitativa do valor. Por exemplo, os componentes de um produto, por mais simples que ele seja, percorrem milhares de quilômetros. Esse é um dos efeitos da padronização, da qual a deslocalização da produção (hoje a produção dos componentes de uma peça é feita em países diversos) é uma das conseqüências, pois gera poluição em cada uma das etapas de fabricação. Também no âmbito social não se é possível ter um controle da mão-de-obra que está sendo utilizada. Um outro exemplo é o desperdício da energia, ou seja, a falta de um sistema onde seria possível a reutilização destas descargas elétricas.

A moda como um veículo de comunicação também tem o papel de educar e orientar, ajudando assim a reduzir essa cultura equivocada que levam as pessoas a consumirem produtos que na realidade não são sustentáveis.



O que é moda sustentável?


Falar de sustentabilidade de um modo geral implica, como todos sabemos, em ter um equilíbrio entre a sociedade, o meio-ambiente e a economia, onde todos sejam positivamente beneficiados.


Quando pensamos na indústria de moda, vemos que estes três elementos, ou podemos dizer “peças-chaves”, estão intimamente conectados, mas não ainda de forma sistêmica ao ponto de gerar esta estabilidade.


Fazer uma moda sustentável no meu ponto de vista não é só equilibrar essas peças, mas trabalhar com um design criativo onde cada processo sirva de inspiração para a formação de novos produtos e até mesmo serviços. É olhar o entorno, e ver que todo e qualquer objeto, seja um descartado ou até mesmo um produto pronto e acabado para uso possuem uma gênese, uma forma, uma essência. Saber explorar, transformar, modificar, interferir nesta essência, agregando valor, tornando-o singular, carregando-o de significado, utilizando-se apenas de elementos comumente encontrados, de natureza simples.


Por isso, quando digo moda sustentável, me refiro a um olhar observador, onde a criatividade possa se manifestar diante do que está em nosso entorno, seja próprio da indústria de moda, mas somado a elementos que nos são dados pela própria natureza, por uma interferência ou uma associação, sendo essa relação de “criador e criatura” dentro da realidade de cada um. E é essa troca, essa experimentação, esse olhar atento, que gera uma conscientização socioambiental, já que o entorno passa a ser um objeto de inspiração e a curiosidade aguçada por conhecer novas possibilidades, materiais, alternativas e experimentações que geram um crescimento científico socialmente.

Fazer moda sustentável é ser mais que autoral e inovador, é disseminar essa conscientização e este aprendizado a todos, mostrando que esta indústria pode contribuir enormemente com esta busca estando conectado com o todo.



Qual é a situação do Brasil nesta área?

Como não existe uma certificação socioambiental para a indústria de moda e as ferramentas de ecodesign existentes hoje não são adequadas ou não contemplam esta cadeia produtiva, as pessoas, de um modo geral, não têm como se orientar com relação aos níveis de sustentabilidade de um produto, por isso muitas vezes “trocam gato por lebre”.

Para piorar, para algumas empresas, inclusive nacionais, a questão da sustentabilidade se tornou um critério de consumo e um “marketing atrativo” para outros. Por isso, está surgindo no Brasil, como uma forma de validar a sustentabilidade de um produto, a auto-certificação, ou seja, através de ONGs e chancelas elaboradas em parcerias com biólogos e ambientalistas, produtos são certificados socialmente em sua natureza extrativista, onde afirma-se um respeito por um desenvolvimento sustentável, por uma moda ética , por um trabalho não-escravo, etc.


Esse “label de identificação” é autoral. Não existe um órgão maior e formalizado que assegure essa certificação. E como é uma autocertificação, isso permite o surgimento de várias... (imagina a confusão!!)




Na sua opinião, quais são as tendências nesta área?


Acredito que, cada vez, a mais a indústria e o artesanal caminham juntos. Esta singularidade, esta busca por um nicho de mercado onde o exclusivo, o singular é o mais valorizado, está em fase de expansão. Essa busca por inovação, novas tecnologias está intimamente relacionada ao trabalho de um ecodesigner. Ele busca no mais complexo o mais simples, por isso digo “ver o entorno como inspiração”, é ver nos processos a interação desse todo.

Além disso, pensar na natureza e na sociedade está se tornando um critério para a escolha de produtos e serviços por parte de compradores e consumidores. Como um critério, não pode ser excludente o fato de que a elaboração de uma certificação socioambiental no Brasil servirá de orientação e atuará como um educador para a sociedade e para os profissionais atuantes na área, trazendo mais ciência para este grupo que é formador de opinião, disseminando esta idéia e conceito.


(Luíza desenvolve acessórios com refugos têxteis - e descartados, de um modo geral - aliados a componentes de origem natural).


Saiba mais sobre o trabalho de Luiza Netto: www.luizanetto.com






Um comentário:

integração disse...

Plenamente d acordo - aqui na Ong ambientalista Integração Cena Urbana desenvolvemos essa visão em todos os aspectos, da moda social ao ecodesign e atualmente entrando na construção ecológica.
visite nosso site vamos ampliar essa rede q é na verdade o futuro presente: www.integraurbana.no.comunidades.net
Abraços Ecológicos
Dayse Cunha